A doença de que padecem os partidos políticos não tem que ser terminal. Não tem que ser se essa for a vontade dos seus lideres e militantes, mas assim será se os dirigentes se deixarem enredar nas redes clientelares que vivem de e para os Partidos (o “aparelho”) e será terminal se os seus militantes não se revoltarem contra este estado de coisas e tomarem os destinos dos seus próprios partidos nas suas mãos, tornando-se de “partidos de aparelho” em “partidos de militantes”. O processo de decomposição interna a que mais acima nomeámos como “jotificação” pode ser combatido. Assim exista vontade para tal por parte da maioria dos militantes e de alguns dirigentes influentes. Todas as estruturas especiais, criadas nas primeiras décadas da democracia para captarem estratos de idade específicos devem ser extintos. Por forma a assegurar uma representatividade especial nos órgãos, quotas por idade (não somente para jovens, mas também para seniores) podem ser avaliadas. Mas estas quotas não devem ter uma leitura absoluta. Devem existir mecanismos flexíveis de compensação, que não bloqueiem a democracia interna quando não for possível completar algumas destas quotas, sem dogmas nem interpretações cegas, usando, por exemplo, a rotação de funções entre membros efectivos e suplentes dos órgãos nacionais.
Esta doença participativa tem cura. E uma cura eficaz se for atacada a partir do seu maior foco (o local e autárquico) e das bases de militantes, por forma a que o esforço seja consistente, amplamente participado e eficaz. O processo de cura terá assim que assentar nas divisões locais dos partidos (secções ou núcleos locais) e no seu grande bloqueio democrático, transversal a todos os partidos, que são os sindicatos de voto. Através do escambo de influências e favores, do simples pagamento de quotas ou da oferta de emprego ou de contratos comerciais ou de prestação de serviços (avençados), muitos núcleos, secções, concelhias ou federações dos partidos políticos escolhem as suas lideranças não em função do programa das coordenações ou presidenciais locais, nem da sua capacidade para cumprirem o mesmo, mas em função da troca de bens ou serviços que têm muito pouco de politico e que são muito próximas da fraude eleitoral. Sejamos mais claros: o escambo de favores ou pagamento de quotas a militantes reais ou a militantes-zombie é uma forma de corrupção, não enquadrada juridicamente, mas ainda asssim uma forma de corromper a democracia interna dos partidos e, logo, a democracia. Extensivamente aplicada em todos os grandes partidos, a sindicância de votos é um fenómeno de grande gravidade, que mina a qualidade das lideranças locais, que assim alcançam e preservam posições não é função dos seus méritos, mas em função dos recursos que conseguem mobilizar para os seus sindicatos de voto. O fenómeno é, contudo, grave também a outros níveis: tornado incontornável devido à sua disseminação, torna-se um bloqueio impossível de vencer a quem quer que queira ascender nos órgãos de base. A sua disseminação e eficácia intensifica a utilização deste método fazendo com que, num fenómeno de imitação do (mau) exemplo, ele se propague aos seus seguidores e futuros competidores que assim, num fenómeno de duplo feedback, farão o mesmo quando chegar a sua vez de disputarem cargos locais ou nacionais, abrindo também eles, e por esta forma, a porta da sua ética pessoal a manifestações mais graves do fenómeno da corrupção. A propagação e continuidade dos sindicatos de voto é muitas vezes assegurada porque os lideres locais ou nacionais que deles beneficiam fazem-no através de “jagunços”, de “homens de mao” sem ética, nem princípios morais, que dão a cara pelo “líder” e que realizam e sem nome os pagamentos e cobranças de sindicatos. Obviamente, numa fase posterior, o “jagunço” exige por sua vez a cobrança do favor, quer reclamando ele próprio uma posição de liderança, quer um qualquer rendimento no Estado ou numa autarquia local. Sejamos claros: aquele que é hoje corrupto sindicando votos, será corrupto quando alcançar as funções que visa conquistar, sejam elas internas ao partido em que milita, sejam elas autárquicas ou de âmbito nacional. Uma forma eficaz, amplamente ensaiada e testada noutros países, de quebrar os “sindicatos de voto” são as eleições primárias para órgãos internos dos partidos e, sobretudo, o fim do pagamento de quotas para que os militantes possam votar. As Primárias (abertas a simpatizantes) poderiam também abrir os partidos, ao nível local e nacional, à cidadania e aos simpatizantes, anulando assim a eficácia dos sindicatos. Paralelamente, e para anular a eficácia desses sindicatos, a transformação da quota em donativo que não tem que ser prestado para que o militante possa votar, permitiria que aqueles candidatos com melhores propostas, programas mais credível ou provas dadas fossem eleitos, não apenas aqueles que maiores recursos financeiros e redes clientelares e de favores conseguissem reunir. Os financiamentos assim perdidos seriam compensados no acto do voto, requerendo aos votantes o pagamento de uma pequena quantia. Simultaneamente, a seriedade, a rectidão, transparência de conduta seriam asseguradas pelo estabelecimento de mecanismos de revogação de mandados, activáveis por petição de uma certa percentagem mínima de militantes. Por fim, os lideres locais e nacionais têm que sacudir de uma forma definitiva e permanente, as hostes de seguidores que os rodeiam, ansiando sempre por benesses e favores. Formas de estímulo à critica, sã, regrada e construtiva devem ser estabelecidas, assim como de prémio e reconhecimento aos melhores.
Rui Martins
Coordenador COTS: Corrente de Opinião Transparência Socialista
Membro (suplente) da Comissão Nacional do Partido Socialista
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