“Os fantasmas do soberanismo e da secessão voltam a pairar sobre a Ibéria. Não, desta vez as ameaças de independência partilhadas pelas elites da Catalunha não se limitam a simples manobras táticas para obter mais recursos do Estado central. O que está em causa é o redespertar de um sentimento nacional acionado por um poderoso factor de confrontação em tempos de crise: a partilha de recursos. A Catalunha, que representa 18% do PIB espanhol, entrega mais 16 mil milhões de euros de impostos do que recebe de Madrid e se essa redistribuição faz parte das regras da progressividade fiscal e dos princípios de coesão social dos Estados descentralizados, a contabilidade da crise transforma esses princípios em reações populistas em que o “roubo” e o “saque” se fazem mais ouvir. (…) Imersa numa grave crise económica, a Ibéria volta a ser assaltada pelo vírus nacionalista. Auguram-se maus tempos para a Espanha. E maus tempos para Portugal, que dificilmente escapará aos danos de uma possível fragmentação do Estado espanhol.”
Fonte:
Editorial do jornal Público
A fragmentação de Espanha é hoje imparável. O agravamento contínuo e sem fim à vista da crise financeira de Espanha torna particularmente chocante a transferência anual de 16 mil milhões de euros para o obeso e ineficiente Estado espanhol e para a sua administração pública.
Num mundo em que o económico é o factor predominante, o impulso centrífugo da Catalunha é imparável, especialmente num contexto de agravamento iminente da carga fiscal decorrente das contrapartidas pelo “resgate” da Troika que Madrid negoceia hoje, nos bastidores. Brevemente, Espanha estará a reclamar ainda mais dinheiro à Catalunha. O tom da resposta catalã já é conhecido e a sua consequência inevitável: a declaração de independência.
Se Espanha perder a contribuição fiscal catalã, num contexto de subida das taxas de juro, de quase insolvência do Estado espanhol e dada a grande dimensão da economia espanhola, o colapso financeiro será impossível de evitar. Com o colapso, as outras regiões solventes de Espanha (Galiza, País Basco/Navarra) terão todas as vantagens em se afastarem desse gigantes com pés de barro e fragmentarem-se sob o peso de uma Madrid anafada e sobredimensionada e uma onda de secessões vai alastrar-se a toda a Espanha.
Portugal será afetado pela turbulência no seu vizinho e maior parceiro comercial, de certo. Mas esta “parceria” é hoje largamente favorável a Espanha, que exporta muito mais para Portugal do que o inverso. No colapso do Estado espanhol poderão brotar condições que estimulem o desenvolvimento de produções industriais e agrícolas de substituição, criando emprego e riqueza em Portugal. Simultaneamente, questões longamente pendentes com Espanha, como os transvases dos rios internacionais, o esbulho das suas águas, a soberania na ZEE e nas Desertas e em Olivença poderão ser finalmente resolvidas.
Numa Península Ibérica livre do poder centrípeto de Madrid, Portugal será – quase automaticamente – a maior potencia ibérica e aproximações políticas e económicas à Galiza e à Catalunha poderão ser determinantes para anular a turbulência resultante da cisão espanhola e alavancar a reconstrução do tecido económico português. Ao contrário daquilo que é articulado no texto do Público, Portugal poderá até sair ganhador (e de forma decisiva) neste processo que começara com a independência catalã e que pode terminar na libertação de toda a Espanha.
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