“A investigação realizada por Dan Ariely, especialista do Massachusetts Institute of Technology (MIT) em economia comportamental (concluiu numa) série de experiências comportamentais com estudantes norte-americanos, destinadas a avaliar a disposição para transgredir as regras de bom comportamento moral, enganando os outros ou a sociedade”:
1. “a primeira verificação que obteve foi a de que, em geral, não há apenas poucas pessoas que transgridem, e transgridem muito, mas há muitas pessoas que transgridem, mas que transgridem pouco. (…) Segundo a teoria económica, um problema desta natureza é uma questão de análise custo-benefício, comparando o ganho da transgressão e o peso da penalidade, ponderado pela probabilidade de esta ocorrer (isto é, de “ser apanhado”). Sendo assim, e segundo o próprio autor do estudo, seria de esperar que a transgressão aumentasse com o prémio “oferecido” e diminuísse com a penalidade prevista. Mas não foi isso que verificou. O que a sua experiência continuou a mostrar, fazendo variar aquelas duas variáveis relevantes para a análise económica do problema, foi que, em vez de as transgressões oscilarem significativamente, continuava a prevalecer a conclusão de que muita gente transgredia, mas transgredia pouco, não reagindo, portanto, aos incentivos económicos, como a teoria económica faria prever.”
2. “Perante estes resultados, a sua inferência foi, então, a de que a “seriedade” é condicionada por dois factores relevantes. Por um lado, gostam de se olhar no espelho e sentir-se bem consigo próprias, vendo-se como pessoas cumpridoras. Mas, por outro lado, sentem que essa perceção sobre si próprias não se altera só um pouco, isto é, se ficarem só na margem da retidão.”
3. “Seguidamente, Ariely procurou testar o que poderia influenciar, aumentando ou diminuindo, este limiar. E os resultados a que chegou são particularmente interessantes. Verificou, por um lado, que referenciar um código moral que as pessoas reconheçam reduz significativamente aquele limiar de transgressão aceitável. E verificou, por outro lado, que, se alguém da mesma sociedade ou grupo social a que se pertence transgride ostensivamente e sem consequências, faz aumentar o limiar de transgressão aceitável. No entanto, se a transgressão ostensiva é feita por alguém com quem não nos identificamos, tal não afeta o nosso limiar.”
4. “Um outro passo da experiência, com resultados também curiosos, permitiu verificar que, quando a remuneração da transgressão é dinheiro “direto”, a dimensão das transgressões é cerca de metade do que quando a remuneração é feita “em espécie”. A ilustração talvez mais fácil desta conclusão é que, a qualquer um, é mais fácil “desviar” uma esferográfica da empresa (ou de qualquer outro lugar) do que “desviar”, do mesmo sítio, o montante de dinheiro correspondente ao valor do objeto”.
Economia, Moral e Política
Vítor Bento
Estes estudo pode ser extremamente interessante para o combate em corrupção em Portugal e no resto do mundo. Em primeiro lugar, a conclusão de que todos transgridem (mas pouco) indica que não é possível conceber uma sociedade sem corrupção e que impor penalizações muito elevadas para crimes ou para a criminalidade de pequena dimensão simplesmente não é eficiente. Isto é, o resultado não compensa o esforço, sobretudo a imposição de penas ou multas pesadas (e a investigação e esforço administrativo que implicam).
O estudo indica uma via simples e muito económica para reduzir a corrupção: a elaboração de um código de ética. De facto, basta saber que existe um qualquer “código de ética”, mesmo sem o conhecer para ter efeitos imediatos na redução da corrupção. Há razoes para crer que se este código fosse elaborado em conjunto, público e periodicamente renovado, a adesão ao mesmo ainda seria superior e mais convicta. O estudo de Dan Ariely tem ainda outra conclusão potencialmente muito útil: a corrupção em figuras públicas, é particularmente negativa no sentido em que se deixar um sentimento de impunidade aumenta os próprios níveis de corrupção na sociedade. A conclusão é simples: o Estado não pode (não deve) deixar que crimes de corrupção sobre figuras públicas fiquem por investigar, não pelo que eles representam em si, mas pelos efeitos que esse (mau) exemplo induzem em toda a comunidade… Neste respeito, os exemplos (infelizes) deixados pelas múltiplas investigações pendentes ao anterior Primeiro-Ministro deixaram uma mossa de alcance ainda hoje difícil de percepcionar…
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