Está ainda em exibição, em Lisboa, um dos filmes mais doces e interessantes que pude ver nos últimos tempos… Trata-se de “Caramel” da realizadora libanesa Nadine Labaki, que interpreta também o papel principal, o filme pode ser classificado sob a classe de “comédia”, mas é um retrato extremamente sensível, suave mas muito interessante de uma das sociedades mais liberais e ocidentalizadas do Médio Oriente. Curiosamente, este filme que está hoje nas nossas salas (mas terão que se apressar porque não deve ali permanecer por muito mais tempo…) foi concluído apenas nove dias antes de Israel desencadear a sua sua mal sucedidade guerra de 33 dias contra o Líbano, em 2006.
A realizadora, Nadine Labaki, declarou que “Num certo sentido, gostaria que o povo israelita visse o filme e compreendesse que tipo de pessoas nós somos”. E de facto, embora a influência do partido islamita radical Hezbollah seja crescente, o Líbano é juntamente com a Tunísia dos países árabes mais liberais no que concerne a direitos cívicos e ao respeito pelos direitos das mulheres. Com efeito, o filme parece ter sido filmado e produzido em relativa liberdade e as mulheres de várias gerações cujas vidas se vão cruzando num salão de beleza em Beirute (“caramel” é o produto de depilação usado no salão) parecem viver em relativa liberdade, numa sociedade que não tem o tom repressivo que encontramos por vezes noutros filmes oriundos da mesma região do globo.
A história desenvolve-se a partir da narrativa cruzada de cinco mulheres: Layal, representada pela própria Nadine Labaki e que tem um caso passional com um homem casado, Nisrine, uma outra cristã que vai casar com um muçulmano, Rima, uma lésbica e Jamal, que enfrenta o desafio do tempo com crescente dificuldade e com… um consumo galopante de fita adesiva.
O filme expõe uma sociedade muito sofisticada, onde as mulheres que pertencem ao grupo cristão maronita se movimentam com relativa liberdade e podem utilizar o mesmo tipo de vestuário de qualquer mulher ocidental. É contudo uma sociedade onde a hipocrisia típica dos regime fanáticos se deixa introduzir aqui e acolá, algo que a realizadora consegue introduzir no argumento com manifestada inteligência e uma subtileza muito feminina… Desde os hotéis que só aceitam reservas em nomes de mulheres casadas e dos seus maridos, até à cristã que tem que realizar uma cirurgia de reconstrução do hímen para que a famíla do noivo (e este…) acreditem que ela vai virgem para o casamento, e uma das outras empregadas do salão que é lésbica, mas que em todo o filme só o deixa transparecer muito subtimelmente, sem que tal tema seja abordado directamente entre as cinco mulheres em algum momento. O filme tem momentos de claro e cristalino humor, mas também outros de drama – sem cair no exagero – e vive muito do brilhantismo da Labaki e da candura das outras actrizes, todas elas participando aqui no seu primeiro filme e produzindo um dos filmes mais curiosos e suaves que vi nos últimos tempos.
A ver, bem depressa, enquanto não esgota, em suma!
P.S.: E muita atenção à banda sonora…
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