Da tese da origem norte-africana da língua dos Cónios falámos em ponto anterior, e dos argumentos aí apresentados já nos ficou uma forte convicção de que seria na região norte-africana que encontraríamos a língua original dos cónios, aquela língua que através dos seu estudo nos poderia levar ao conhecimento da língua dos cónios. A arqueologia deixou-nos abundantes provas da intensidade de contactos entre o Norte de África e a Península Ibérica. Exemplos como os de que nos fala Carlos Tavares da Silva que no artigo “Influências orientalizantes no Calcolítico do Centro e Sul de Portugal” nos apresenta os achados descobertos por R. J. Harrison e A. Gilman. Estes artefactos de marfim descobertos na Península Ibérica (como fragmentos de marfim por trabalhar, braceletes e contas) eram com efeito, como provariam esses investigadores, de importações norte-africanas. Quanto à origem das contas de casca de ovo de avestruz descobertas em Los Millares ainda menos dúvidas existem. Estes contactos revelarão uma comunidade étnica e linguística entre as duas margens do Mediterrâneo?
Esta tese concorda em absoluto com a que Oliveira Martins apresentou nas primeiras páginas da sua “História da Civilização Ibérica”. Segundo este historiador, “O ibero, cuja tez morena e cabelo crespo (colorati vultus et torsi plerumque crines, Tácito) caracterizam o Sículo, proviria da mesma origem hamita ou afro-semita dos Tuaregues e Berberes, Coptas e Egípcios, em que se filiam os Sículos e os Lígures.”
Deste modo, e através das vagas migratórias que abordámos no ponto 4.3, estas populações norte-africanas ter-se-iam instalado na Península, sobretudo no seu Sul e, mais especificamente, no Cuneus Ager. Em favor desta tese, Oliveira Martins realçava ainda o sufixo Tani que surge na terminação de tantos nomes étnicos das duas margens do Mediterrâneo (Lusitano, Turdetani, Mauretani). O. Martins realça ainda que esta terminação é semelhante a Tah, a palavra berbere que surge em muitos dos antropónimos deste povo.
Mas apresentemos enfim a citação basilar de Oliveira Martins que nos serve de fundamento principal para a tese cabila: “Os cabilas são os genuínos representantes dos Númidas de Massinissa, de Sífax e de Jugurtha, terríveis para os Romanos. As invasões sucessivas destes e dos Vândalos, dos Fenícios e dos Árabes repeliram-nos das costas de África, onde a velha religião e a língua antiga foram vencidas, para o interior, onde se conservaram até nós, puros, alguns documentos da sua existência remota. Quase idêntica ao tuaregue e aos idiomas sarianos, desde o Senegal até à Núbia, para aquém dos negróides do Sudão, a língua cabila ou berbere é afim da do Egipto, o copta”.
Na tese deste autor, tese parcialmente substanciada pelas provas arqueológicas, a língua Cabila, nos seus dialectos Tamazight, Tarifiyt, Taqbayliyt, Tashawit e Tarifit, é uma sobrevivente das línguas do mesmo tronco a que pertenciam os povos que em vagas sucessivas atravessaram o Estreito de Gibraltar e se instalaram na Península Ibérica. De tudo o dito neste ponto e no já mencionado ponto 4.3 a tese cabila/berbere é aquela que nos apresenta como mais próxima da língua que serve de objecto a este ensaio.
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