Recentemente, recebi o último número da Newsletter da E. F. Shumacher Society, de que sou ainda o único membro português e nela um interessante artigo sobre uma conferência proferida por um dos seus membros, Richard Heinberg sobre o muito agudo tema do “Pico Petrolífero” e sobre as suas consequências para a agricultura e para a produção mundial de alimentos… Um tema que tenho abordado de forma recorrente nos meus debates com o Ultramar, acérrimo defensor do Etanol como alternativa aos combustíveis fósseis… Eis alguns segmentos deste texto, com comentários meus intercalados:
“À medida que o mundo atravessa o pico da produção petrolífera seremos novamente sujeitos ao princípio energético: custa energia tirar energia ao ambiente, e estes custos devem ser subtraídos aos rendimentos brutos” Richard Heinberg, na sua leitura na conferência de 2006 na E. F. Schumachr Society, disse “nós temos vivido de energia virtualmente gratuita nos últimos duzentos anos.” E convidou-nos a “imaginar empurrar o nosso carro durante vinte ou trinta milhas, a distância que um carro pode viajar com apenas um galão de gasolina. Esta é a energia equivalente a cerca de seis a oito semanas de duro trabalho humano.” O que a energia fóssil abundante facilitou foi a mecanização de todos os processos imagináveis, incluindo a agricultura.”
Esta consequência da previsível alta dos preços do barril de petróleo aos 200 dólares num futuro próximo não tem recebido a atenção devida… A esmagadora maioria dos alimentos que consumimos são produzidos pela agroindústria, a qual precisa de uma mecanização abundante e generalizada para recolher os níveis de rendimento a que estamos habituados… Se os custos com combustível dispararem para os valores que muitos especialistas temem, isso vai fazer disparar os preços dos bens agrícolas e levar a uma onda generalizada dos pequenos e médios agricultores, incapazes de lidarem com as dificuldades do período de transição e sem o capital necessário para sobreviver a esta. Assim, é inevitável o regresso aos campos, invertendo o êxodo rural, tornando-o em êxodo citadino e repovoando os mesmos campos que este governo se tem esforçado por esvaziar o mais possível, cumprindo obedientemente os ditames de Bruxelas…
“Será possível que a solução resida na desindustrialização deliberada da produção, mas feita de uma forma tão inteligente, usando a informação recolhida da Ciência da Ecologia, assim como dos métodos tradicionais de agricultura?” Ele acredita que sim, que tal é possível, e que de facto é imperativo que se siga uma tal abordagem.Partindo de um período específico da história cubana como referência, Heinberg estima que para manter a produção alimentar actual seria necessários somar 15 milhões de agricultores aos actuais 4 milhões. Contudo, um regresso à terra iria requerer mais do agricultores com boas intenções… Heinger acredita que estes agricultores teriam que ser ajudados por um acesso financeiramente viável à terra, treinamento universitário em métodos agricolas de pequena escala, ajuda financeira directa na fase de arranque e por empréstimos de Longo Prazo.”
A desindustrialização da agricultura retiraria de cena aquelas que têm sido as maiores causas da sucessão de problemas de Saúde que têm assolado na Humanidade e que no Futuro serão ainda mais graves… A “Gripe das Aves” só existe porque existem criação industriais de aves, e o mesmo se pode dizer da BSE, das pragas em regimes de Plantações onde não existe biodiversidade, das hormonas em carne de criação industrial, etc, etc, etc… Todos estes exemplos são casos de revolta da Natureza perante um Homem que lhe exige cada vez mais violentando a sua essência natural…
“Não é simples, e vai requerer um esforço nacional coordenado e sustentado. Mas para além de erradicar a Fome esta estratégia também nos vai permitir resolver uma série de problemas sociais e ambientais”. Diz-nos Heinberg que “se fizermos isto bem, isto significará a revitalização não só da Democracia, mas da Família e de uma Cultura autêntica, baseada no lugar.”
Mas a transição de uma agroindustria para uma agricultura de rosto humano e amiga do ambiente poderia ter um custo de curto prazo considerável… A redução da produção, a alta dos preços e fome e morte generalizadas… Mas permitir absorver as legiões de desempregados que o Ocidente hoje fabrica, repovoar o Interior de todos os países desenvolvidos, rehumanizar as cidades, tornadas hoje verdadeiros infernos de formigas desesperadas e stressadas por um ambiente humano demasiado denso e desenvolver as economias locais e regionais, estranguladas por Economias globais e nacionais crescentemente desumanas e cada vez mais criadoras de desigualdades sociais e económicas.
“Na sua conferência Richard Heinberg delineou claramente as razões para o regresso a um sistema agrícola desenhado especificamente para fornecer comida à sua própria região. Como um perito no futuro do petróleo e em gás natural ele está bem posicionado para nos dizer que precisamos de começar a fazer algumas mudanças. A produção de comida é a nossa principal preocupação não somente porque está fortemente dependente de combustíveis fósseis, mas também porque a continuação desta produção é vital para a nossa sobrevivência.”
Como sempre, e é este um dos princípios fundamentais do pensamento do economista E. F. Schumacher, a raíz desta nova Revolução Agrícola estaria nas Economias regionais… A autonomia e a autosuficiência seriam aqui factores-chave de sucesso, não desprezando a produção de excedentes exportáveis, mas concentrando os esforços na criação de uma rede de produções que satisfazessem as necessidades locais e dispensando assim os onerosos e consumidores de combustíveis meios pesados de transporte.
“Heinberg gostaria que “aceitássemos o desafio actual – a iminente grande transição energética – como uma oportunidade para reimaginar a cultura humana a partir do solo, usando a nossa inteligência e a nossa paixão para o Bem das próximas gerações e para a integridade da natureza como os nossos principais guias.”
Outra consequência positiva deste “regresso aos campos” estaria na redução dos problemas sociais e psicológicos que assolam hoje a juventude e que estão na directa razão da explosão da pequena criminalidade e dos números de consumidores de todos os tipos de drogas: a desadequação e a perda de perspectivas de futuro nos meios urbanos e o afastamento radical das sociedades em relação ao Campo e aquilo que representa o esforço do Trabalho e da Produção agrícolas… Recentrar uma Economia na Produção e não nos “Serviços” significaria devolver a esta a dignidade da autosuficiência e os níveis de Emprego e realização pessoal que esta Globalização desumana e economicista lhe tem negado a ritmos cada vez mais intensos.
Este texto pode ser encontrado na sua forma integral em:
http://www.smallisbeautiful.org/publications.html
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