Como observa Cavalli-Sforza, as mudanças linguísticas ocorrem de modo análogo ao das mutações genéticas, mas a um ritmo muito mais rápido, e esta rapidez vem dificultar o trabalho dos linguistas. É também frequente que em consequência de invasão ou de uma corrente migratória muito forte, a língua das populações conquistadas se extinga. Sendo assim, é facilmente compreensível porque é que hoje nas línguas peninsulares poucos vestígios de palavras berberes podem ser encontrados (a palavra castelhana e portuguesa “mata” constitui uma das raras excepções). A antropologia física foi considerada no século XIX como a chave para desvendar o mistério da origem dos povos, entre ela, o estudo das formas do crânio foi extremamente popular, com a divisão dos povos em dolicocéfalos e braquicéfalos, uma classificação que permitiria supostamente desvendar a verdadeira origem dos povos europeus modernos. Contudo, trabalhos recentes vieram reduzir o mérito destas teses ao confirmar que a pressão do ambiente pode mudar muito drasticamente uma determinada morfologia óssea. Assim sendo, Cavalli-Sforza reconheceu nos estudos genéticos como a mais válida e científica forma de investigar e determinar as origens profundas de uma população humana.
Só os genes possuem a estabilidade suficiente para que possamos deduzir migrações, origens e parentescos entre duas populações distintas.
Existe um paralelismo quase universal entre a genética e a linguística. Povos geneticamente próximos falam em quase todo o mundo línguas da mesma família, algo que o trabalho de Cavalli-Sforza permitiu aclarar para além de qualquer dúvida. Em consequência, do estudo comparativo da genética dos povos que falavam as línguas que apresentámos na secção dedicada às línguas-hipótese, poderemos deduzir também quais serão aquelas que em resultado das comparações genéticas devem ser excluídas como podendo ser as utilizadas pelos antepassados dos portugueses do sul, os cónios. Na tabela 5.5.1 do já sobejamente citado “The History and Geography of Human Genes” apresenta-se uma tabela das distâncias genéticas de 26 populações europeias. Aqui, os portugueses surgem como muito próximos (por ordem) de: italianos, espanhóis, checos, suecos, noruegueses, franceses e ingleses; e como distantes de lapões, bascos, sardos, gregos, finlandeses, balcânicos e escoceses. Estas dissemelhanças permitem reduzir a probabilidade da língua dos cónios ser o basco, o sardo, o grego e o albanês; mas reforçam aquela que é a nossa tese favorita: a hipótese berbere… Uma vez que as populações que nos são mais próximas são todas parte da matriz mediterrânica; com excepção dos nórdicos, uma variação que pode ser explicada pela sobrevivência nos extremos norte e sul da Europa de genes das populações mesolíticas pré-capcenses anteriores às invasões berberes.
Em Portugal, tem escasseado o trabalho na área da Genética Histórica. Contudo, as recentes investigações conduzidas no Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto pelo professor António Amorim permitiram lançar alguma luz adicional sobre a origem norte-africana dos portugueses. A. Amorim não encontrou em Portugal os cromossomas Y “negros” típicos da África sub-saariana, mas em seu lugar descobriu tipos de cromossomas que surgem frequentemente no Norte de África. Estes cromossomas, presentes em toda a faixa atlântica ibérica, estão concentrados sobretudo a Sul, junto ao continente africano. António Amorim encontra na colonização berbere que resultou da invasão muçulmana de 711 os introdutores destes genes, mas se nos recordamos da tese da origem Capsense das populações não-indoeuropeias do Mediterrâneo, chegaremos rapidamente à origem profunda destas características genéticas sobreviventes ainda hoje nos portugueses de hoje: os cónios…
Interessantíssimo este estudo comparativo!
“O grupo genético U6a representa a primeira expansão do Magrebe para Este no Paleolítico e o subgrupo u6a1( +/-20.000 a 15.000 anos) assinala um posterior movimento do Este de África para o Magrebe e próximo Oriente. Esta migração coincide com expansão das línguas Afro-Asiáticas”. Os estudos genéticos apontam para uma origem berbere na Europa para o grupo de ADN MT U6a1, no qual me encontro. Apesar de representarmos +/- 3% da população da Ibéria e ainda mais raros no resto da Europa, seria com imenso prazer e orgulho que pudesse dizer…Sou descendente dos cónios!